Amy, hoje no trabalho eu escutei muita bobagem a respeito de você, dos seus exageros, da sua morte. Tenho tentado aprender que nem todos são empatas por si só, tenho ficado mais quieta que feito fumaça e me enfiado em discussões improdutivas. Poucas pessoas me passam a sensação de sofá da sala, que é mais ou menos essa: se conhecesse ao vivo, em cores e olfatos, poderia fazer um zilhão de perguntas que soariam pertinentes e ter conversas bastante produtivas. Você, por certo, está dentro das transloucadas que tanto admiro por aí. Fique sabendo que este é um elogio e tanto - afinal, são poucas.
Amy, você se foi logo quando sentada naquela curva onde todos acreditávamos: ela tem melhorado, está mais coradinha, vai sair dessa. Estarreci ao ligar o netbook e presenciar que era real, que você tinha finalmente entrado pra turma dos legendários que abandonam a gente cedo demais, aos 27 anos de idade. Quem mais vai cantar sobre caras que são bem mais velhos e deveriam ser mais fortes que a gente, mas não passam de uns medrosos? A que moça você passou o bastão pra contar o quão horrível é ser uma perdedora nos jogos de amor? Tem alguém por aqui que inspire força, autenticidade e rebeldia suficiente pra falar sobre o luto negro dos relacionamentos que precisam acabar? Ainda busco tateando, no escuro, e tudo que escuto não tem três pinguinhos da sua originalidade. São banais.
Amy, por que é que a gente acorda sempre sozinha quando é forte demais? Amy, tem alguma cantorinha que procure o amor na plateia e sussurre "eu te amo" antes de começar a música? Amy, é difícil se manter o dia todo ocupada pra não surtar, eu sei, bem que sei. A gente se levanta, limpa a casa - ao menos não estamos bebendo, lembra? - e faz um esforço descomunal pra ser normal; chega a dar medo. Amy, no fim das contas: eu, assim como esses nossos corações selvagens, também prefiro ser inquieta. E é por esse motivo mesmo que eles todos sabem que a gente não é boa, não o suficiente pra mesmice que todos tão acostumados.
Amy, a gente para em determinado momento da vida de se auto-enganar? Como faço pra fugir correndo de salto na mão desses caras que só querem jogos, lances de uma noite ou aventuras esporádicas? Amy, deságua aí em alguém que escreva verdade, que narre cotidianos desses que se entregam demais ao playground sinuoso que é a vida. Vai, encarna aí numa senhorinha, na menina negra que tem timbre, num rapaz que compreenda a alma feminina ou seja também um impulsivo e envia pra nós suas visões de alma que segue viva na memória alheia, nos botecos de esquina, nas ruas mais cabulosas de cidades caóticas.
Amy, Amy, Amy: feito um desses feitos astronômicos que passam pela Terra uma vez que outra, anos após anos, nos resta sentar e esperar tanta energia criativa bem desperdiçada surgir por aqui outra vez. Amy, tem esses quadrados que se disfarçam de admiradores, tem esse povo que crê mais no que lê por aí do que nas letras que tocam e nas notas escolhidas a dedo, mas a real é que a gente sente falta da sua presença de palco, da sua maluquice urbana, da falta de jeito que acabou se tornando jeito demais e, depois disso, mais nada. Você nem disse adeus com palavra nenhuma, mas nessa época quem morre centenas de vezes somos nós. Infelizmente.
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